Nas Filipinas nos falaram de um tal de vinho de coco. Foi a primeira vez que escutamos sobre o assunto e nos interessou muito, afinal vinho e coco juntos em um mesmo termo nos soou muito bem. Por lá, o tal vinho de coco é chamado de Tuba e curiosos que somos, lá fomos atrás dele.

Pergunta aqui, pergunta ali e finalmente encontramos um contato.
— Tuba? Vocês querem experimentar Tuba? É sério? Lá na venda do Sr. X tem.

Experimentando o vinho de coco

Pensamos que a venda do Sr. X seria um armazém vendendo garrafas de bebidas alcóolicas e que uma delas seria a garrafa de tuba. Não foi bem assim. A venda era uma casinha na estrada principal da ilha, um simples balcão virado para a rua. Um casal mais velho, que pareciam ser os donos da venda, conversavam com um cliente sentado do lado da rua.

— Kumusta ka? (é assim que se fala “Como você está?” em filipino – lembrou português?)
— Queremos experimentar tuba.

Abriu um sorriso, pegou o seu galão com um líquido laranja, e nos deu para experimentar. Era bom, gosto e cheiro forte de fermentação natural. A noite faríamos um peixe grelhado na folha de bananeira e queríamos levar um pouco para o hotel.

— Podemos levar?
— Quantos litros?
— Só um pouquinho, só para experimentar.

Foi até os fundos, pegou uma garrafa vazia, encheu e nos entregou. A senhora nos disse que a noite fica mais forte e que se tivéssemos outra oportunidade, seria melhor experimentar o vinho fresco pela manhã, pois fica mais suave.

A comunicação em inglês não era tão boa, mas queríamos aprender mais sobre aquele líquido laranja que dizem que vêm do coco. Como não conhecíamos nada daquilo, ainda estávamos associando vinhos ao modelo das vinícolas. Queríamos conhecer alguma “vinícola” que produz vinho de coco.

— Gostaríamos de ver a produção de Tuba? Quem faz o tuba?
— O coqueiro.
— Sim, mas e o processo de fermentação, podemos ver o processo?
— É de manhã. Cortam o coqueiro todos os dias.

Caramba! Ela não está nos entendendo.
Mas ela estava…

O que é o vinho de coco

Depois de descobrir a aparência do vinho de coco, começamos a reconhecer a venda de Tuba em todos os lugares de Siquijor, a ilha que estávamos. Parávamos nas vendas à beira da estrada para tomar um copo e assim tentar aprender um pouco mais.

Depois de pesquisar, descobrimos que esse tal vinho de coco é comum em vários países. Nas Filipinas chama-se Tuba, mas na Índia é conhecido como Toddy, na Indonésia Tuak, na Angola é Manjenvo e por aí vai…

Aprendemos que Tuba nada mais é do que a fermentação da seiva retirada da inflorescência do coqueiro ou de outros tipos de palmeiras. Nas Filipinas, a Tuba consumida é principalmente a da seiva das palmas de coco, por isso que é conhecido como vinho de coco.

O coletor (em inglês chama de tapper) sobe no coqueiro, faz um corte na inflorescência e amarra um galão para coletar a seiva. A produção de Tuba exige um rotina de subir duas vezes por dia no coqueiro. No fim do dia o coletor sobe para fazer uma poda na inflorescência de maneira que a seiva goteje no galão durante toda a noite. Então, sobe novamente pela manhã, quando a seiva é retirada do galão de coleta e já está pronta para venda.

Se beber a seiva do coqueiro no momento que é coletado, sentirá uma bebida super doce e pouco alcóolica, mas a fermentação é rápida e em 3-4 dias já virou vinagre. Se a temperatura e o processo forem controlados, é possível ter uma fermentação mais longa. Também dá para destilar a seiva e transformar em uma espécie de vodka, nas Filipinas, a bebida destilada é chamada de Lambanog.

A cor natural é leitosa, mas em algumas ilhas das Filipinas é gosto popular a cor alaranjada. Esta cor vem de pedaços de um tronco de árvore que são adicionados no processo. Dizem que este tronco ajuda a desacelerar o processo de fermentação, que é bem rápido em temperatura ambiente.

A caça aos coqueiros de tuba

Estávamos fascinados com tudo aquilo, queríamos conhecer mais sobre o vinho de coco. Somos do Brasil, poxa, temos tantos coqueiros, como é que não conhecíamos sobre isso?

Começamos novamente a fase de “pergunta aqui e pergunta ali”… Nos indicaram uma região onde tinham coqueiros de Tuba e lá fomos nós. A caça aos ingredientes é sempre uma das melhores partes da nossa viagem.

De moto, nos enfiamos para dentro da ilha de Siquijor. Quanto mais dirigíamos, mais local tudo ficava. Não tinha muita gente para pedir informação, mas encontramos alguns meninos próximos a entrada de uma cachoeira.

— Oi! Queremos ver a coleta de Tuba. Vocês conhecem alguém?
— Sim, vem cá que te levamos até lá.

Sem mais palavras, os dois meninos subiram em uma moto e acenavam para acompanhar. Esse é um daqueles momentos que te espantam por três coisas. Primeiro, em perceber como a hospitalidade é algo incrível e tocante. Segundo, como o contexto onde crescemos moldou nossos comportamentos. Somos brasileiros que moravam em São Paulo, ir atrás de dois meninos que você não conhece em uma moto para dentro de uma ilha, não é algo aconselhável. E terceiro, como viajar te faz quebrar estes medos e descobrir que existe muita gente boa nesse mundo.

Confira como a coleta do vinho de coco é feita

E finalmente, a coleta do vinho de coco

Chegamos em uma casa bem simples, umas galinhas no quintal, um pai, uma mãe e seus filhos. Nas Filipinas, principalmente os mais novos falam bom inglês. Contamos que viemos conhecer a coleta de Tuba, todo mundo ficou fascinado. Com certeza não são muitos viajantes que têm esse interesse e chegam até ali.

O pai da família era o coletor e nos contou que as árvores de vinho de coco são exclusivas para isso. Não era hora da coleta, mas mesmo assim ele nos mostrou o processo. Subiu na árvore com o seu facão, podou a inflorescência, coletou a seiva que já estava no galão e desceu com a Tuba fresquinha.
Bebemos ali mesmo com a família e com os meninos que nos ajudaram a encontrá-los. De bônus, ele ainda subiu em outro coqueiro e desceu com um dos cocos mais frescos que já tomamos.

No fim entendemos o que a primeira vendedora de tuba nos disse: Quem faz o vinho de coco é o coqueiro.

Experimentando o vinho de coco e bebendo coco fresco